Pokémon Go – Como entender tanto sucesso?

Um dos assuntos mais comentados nos últimos dias é o jogo Pokémon Go. Lançado apenas na última quarta-feira no Brasil, o aplicativo superou a marca de 50 milhões de downloads em menos de 24 horas. Seu sucesso é notório, mas como compreendê-lo?

O Psiquiatra Daniel de Barros, colunista do Estadão, comentou o assunto em seu artigo “Você e Pokémon – quem é que pega quem?”, publicado nesta quinta-feira. Para ele, a explicação recai sobre o conceito comportamentalista de “reforço intermitente” – um tipo específico de consequenciação produzida pelo comportamento. No Reforço Intermitente o comportamento atinge seus “objetivos” algumas vezes, e em outras, não atinge. No caso do jogo, o comportamento em questão é a classe ampla “jogar”, que é composta por um conjunto específico de atitudes – 1) pegar o celular, 2) acessar o aplicativo, 3) andar pela cidade e 4) executar comandos específicos do jogo para a captura do monstrinho. Em algumas ocasiões, essa sequência comportamental resulta na descoberta e captura de um Pokémon (é reforçada por completo), em outras, resulta apenas na descoberta e não na captura (reforço apenas dos comportamentos 1, 2 e 3 da sequência), ou ainda, sequer resulta na descoberta do personagem (extinção da sequência completa). Podemos incluir na análise, ainda, a conquista de ginásios Pokémons, fazer parte de equipes, ganhar pontos e a subir de “levels” (níveis) no jogo, que também funcionam como reforço para a classe comportamental “jogar”. O prazer, o orgulho e a satisfação são emoções comuns neste contexto.

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Quando submetida a este tipo de consequência comportamental (reforço intermitente), a pessoa nunca sabe quando sua caçada vai dar certo. Assim, permanece o tempo todo de atenta. Como explica Daniel:

“(…) como você não sabe quando aparecerá o monstro a ser capturado fica o tempo todo de olho na tela. Se não está jogando, fica imaginando se encontraria um Pokémon naquela mesma hora se desse uma checada. Acaba ligando o celular. Nada. Dali a alguns minutos tenta de novo. Nada. De repente aparece um. Recompensa. E o ciclo se reinicia. ”

Daniel tem razão em sua explicação, porém, para que ela fique completa, é preciso olhar ainda para outro conjunto de circunstâncias: 1) a expectativa que se formou a respeito do jogo, 2) o valor social do jogo, 3) a imitação e 4) a história pessoal de cada um com a marca “Pokémon”.

A expectativa em torno do jogo pode ser compreendida através do conceito skinneriano de “comportamento controlado por regras”. De forma simplificada, as regras são as coisas que ouvimos, lemos, falamos e pensamos sobre algo (nossas crenças) – no caso, o jogo, que desde seu lançamento mundial, tem sido citado em diversos sites de notícias e nas redes sociais como um verdadeiro sucesso, como um game diferente, inovador. Quando chegou ao Brasil, portanto, já sabíamos (ou pensávamos) muito sobre ele, de forma que nosso primeiro contato com Pokémon Go passou longe de ser neutro! Na ocasião, já olhávamos para ele como um jogo de qualidade, inovador, divertido e sinônimo de sucesso. Já o valorizávamos, antes mesmo de termos conhecido, e portanto, já tínhamos alta probabilidade de, ao menos inicialmente, tentarmos nos transformar em mestres Pokémon. Ficamos ansiosos esperando por ele.

O valor social do jogo pode ser compreendido através do conceito behaviorista de “reforço social”. Muita gente falando dele, muita gente jogando e interagindo com outros jogadores. Quem não joga, acaba sendo deixado “meio de lado” (não precisa muito, só um pouco). Não por maldade de quem joga, mas pelo fluxo natural das interações sociais: se eu não sei falar daquilo que todo mundo está falando, não tenho condições de interagir. Para ilustrar, imagine-se em meio a uma roda de astrofísicos conversando sobre a composição química da matéria escura. Por onde você começaria a opinar sobre o assunto? Certamente teria dificuldades para entrar na conversa, ao passo que aqueles que conhecem o jogo, se divertem e interagem de forma mais ou menos contínua.

O conceito de imitação, também discutido por Skinner, tem aplicação simples para compreensão do fenômeno. Nós tendemos a imitar, de forma não consciente, comportamentos que produzem reforço (no caso, a diversão do jogo, a interação social e as outras consequências apetitivas já citadas no texto).  Se muita gente está se divertindo com alguma coisa, aquilo provavelmente é legal, então, devo tentar também. E assim, se ao jogar eu também me divirto e tenho acesso ao reforço social do grupo, me envolvo cada vez mais com a atividade.

Por fim, Pokémon é uma franquia antiga. Trata-se de um desenho animado (ou anime) que fez muito sucesso na década de 1990. Muitos dos jogadores tiveram momentos felizes, de diversão e descontração assistindo Pokémon. Esses momentos tornaram Pokémon um símbolo de alegria e da “docilidade” da infância, de forma que, ao jogar o game da Nintendo, as pessoas experimentam novamente as sensações daquela época – chamamos isso de “nostalgia”. O fenômeno pode ser compreendido por meio do conceito de Condicionamento Clássico: quando uma situação inicialmente neutra (Pokémon) é pareada a algo agradável (a diversão), aquela situação se torna capaz de, sozinha, produzir sensações agradáveis. Tudo o que estiver associado a ela (o nome, as imagens dos personagens do jogo, etc) adquire o mesmo poder. E, assim, nos dias de hoje o jogo é naturalmente interessante a todos os que viveram naquela época e interagiram com a marca.

Cada uma das possibilidades acima discutidas se aplica de forma diferente a pessoas diferentes. Alguns jogam principalmente em função das consequências diretas do jogo (descoberta de Pokémons, pontos, etc), outros, em função das consequências sociais, outros pelo conjunto da obra e assim por diante. O fato é que o jogo recém lançado abre margem a diversas interpretações e acabou se transformando em um prato cheio para elucubrações teóricas. Por óbvio, outras possibilidades podem ser levantadas. Neste texto busquei uma reflexão inicial sobre o fenômeno, e a partir dela, gostaria de apresentar um convite ao leitor: que outras variáveis podem estar envolvidas na determinação do comportamento de jogar Pokémon Go?

 

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